Instituto de Combate ao Enfarte do Miocárdio

 

 

 

Livro: Teoria Miogênica do Enfarte Miocárdico - Parte 6; Mesquita, QH de

 

ÍNDICE

 

Angiografia Coronária e Ventriculografia

 

Trata-se de exame subsidiário muito importante nas condições que se destinam a avaliação de indicação cirúrgica; no entanto, na atividade clínica comum, não temos necessidade de sua informação rotineira, porque qualquer panorama angiográfico coronário é tratado sempre da mesma maneira e com o objetivo de se preservar a função ventricular, garantindo-se a eliminação do confronto entre os segmentos ventriculares isquêmicos e os não isquêmicos, através de um nivelamento por cima pelo cardiotônico. Não há absoluta necessidade de sua indicação para comprovação do diagnóstico clínico e eletrocardiográfico.

 

O volume de pacientes coronariopatas é muito grande e o método invasivo é agressivo e não muito aceito pelos pacientes, desde que não haja uma justificativa maior. Dentro dessa ordem de raciocínio, não exigimos de nossos pacientes o sacrifício de submeterem-se a este método, porque na realidade o resultado não nos induzirá a qualquer medida terapêutica diversa daquela que esposamos.

 

Acreditamos que dentro em breve os métodos não invasivos como a Ecocardiografia e a Cintigrafia miocárdica, enriquecerão mais comodamente os nossos meios diagnósticos e auxiliarão o julgamento prognóstico com a máxima segurança.

 

Temos nos valido da arteriografia coronária, a título de amostragem, em 16 pacientes (12,6%) tratados de síndrome intermediária e em 181 pacientes (15,3%) portadores de quadro clínico enfartante (Quadro 13), a fim de verificarmos a incidência de lesões das artérias coronárias - 1, 2 ou 3 coronárias lesadas - o registro da circulação colateral e a repercussão ventriculográfica.

 

O achado de obstrução total nos pacientes de síndrome intermediária, pode ter significado de tratar-se de enfartado antigo e no qual possa ter se processado a trombose coronária secundária (2/16; 12,5%), mas quando não se registra qualquer antecedente clínico de enfarte, a obstrução total evidentemente deve representar processo obstrutivo de natureza aterosclerótica, portanto pré-existente (5/16; 31,2%). Também no processo do quadro clínico enfartante sustado, os aspectos de obstrução total de artéria coronária não podem ser interpretados como agudos, porque os achados enzimáticos seriados não justificariam o diagnóstico de enfarte, mas se ajustariam a perturbações eletrofisiológicas comuns a falência miocárdica regional e à agressão isquêmica miocárdica que não chegou à concretização necrótica.

 

Neste particular, temos registrado em 60,1% (71/118 pts), obstrução de artéria coronária total que não foi interpretada como decorrente de processo trombótico primário. Em todos, a lesão obstrutiva é admitida como pré-existente no acometimento do quadro clínico enfartante, uma vez que os picos enzimáticos são registrados como inferiores a 2 vezes o parâmetro superior normal.

 

No processo enfartado, embora atenuado, em que os níveis enzimáticos são observados em média cerca de 5 vezes o parâmetro superior normal, a incidência de processo obstrutivo total de 63,4% (40/63 pacientes), não pode ser considerado como pré-existente, porque há indicação enzimática de ocorrência de necrose; entretanto, acreditamos que parte desse grupo possa ter tido a obstrução total anterior ao quadro clínico enfartante e de natureza aterosclerótica.

 

Por simples amostragem, os aspectos registrados para a síndrome intermediária, quadro clínico enfartante sustado e quadro clínico enfartante, enfartado, com incidências aproximadas no tocante ao número de artérias lesadas, de artérias com obstrução total e de artérias pérvias, serviram para unificação dos 3 grupos, em conseqüência da grande identidade e por representarem processos do mesmo grau na evolução da história natural da coronariopatia crônica (Quadro 14). Assim considerados, passamos a apreciar a presença de circulação colateral e demais aspectos de repercussão sobre o ventriculograma esquerdo (Quadro 14).

 

O desenvolvimento de circulação colateral apresenta-se como predominante repercussão de obstrução total de artéria coronária (129-132).

 

A assinergia ventricular é registrada tanto no processo obstrutivo total como nas lesões coronárias estenóticas de qualquer grau (significantes e insignificantes), e até em coronárias angiograficamente normais e no fluxo lento coronário com artérias normais. A assinergia de 1 segmento de parede ventricular é observada como aspecto predominante.

 

O aneurisma ventricular é observado com predominância absoluta nos processos de artéria descendente anterior com lesão estenótica ou obstrutiva total, exceto em um caso do lesão estenótica predominante da artéria circunflexa. Além do mais, é na lesão isolada da descendente anterior que se registram 7 casos (58,3%) e os outros 5 casos (41,7%) em associação com lesões de mais uma ou duas coronárias.

 

Ponte miocárdica é registrada em 13 casos (6,5%) de processos estenóticos de qualquer grau e até de obstrução total ou no fluxo lento coronário, mas sempre situado no terço médio da artéria coronária descendente anterior.

 

Proplapso de folheto da mitral é registrado em 5 casos (2,5%) desde coronárias normais até coronárias com obstrução total.

 

Insuficiência mitral é registrada em 3 casos (1,5%) com lesões sérias de 2 ou 3 coronárias, parecendo haver relativa predominância de lesões associadas da descendente anterior e circunflexa.

 

O volume residual sistólico desses casos, tratados desde o início com o cardiotônico mostra-se aumentado com predominância na obstrução total e lesões coronárias estenóticas significantes (> 50%), mas se registram alterações com certo significado também em coronárias normais.

 

61 pacientes desta amostragem tem lesões isoladas (Quadro 15) de uma das 3 coronárias extramurais maiores, na qual a coronária direita lesada ocorre em 26,2% (16/61 pts), a coronária descendente anterior em 65,6% (40/61-pts) e a artéria circunflexa em 8,2% (5/61 pts), cada qual apresenta repercussão sobre o ventriculograma esquerdo com definida preponderância sobre segmento isolado da parede ventricular; sobressaindo-se a presença de assinergia da parede inferior nas lesões da coronária direita, da parede anterior e anteroapical nas lesões da coronária descendente anterior, e da parede inferior ou inferolateral nas lesões da artéria coronária circunflexa.

 

De todas as artérias coronárias referidas é a descendente anterior esquerda a que mais agrava o ventriculograma esquerdo com grande predominância de assinergia anteroapical.

 

De nossas observações angiográficas coronárias em pacientes sob uso contínuo do cardiotônico a longo prazo, como profilático do enfarte miocárdico, através da preservação funcional do miocárdio isquêmico e o miocárdio não isquêmico em equilíbrio, isto é nivelados por cima, apresentamos resultados de 31 pacientes recateterizados analisadas as coronárias angiograficamente e o ventriculograma esquerdo, com a média de 26 meses de tratamento ininterrupto (84). Constitui-se a série de 3 pacientes de fluxo lento coronário e coronárias normais, exceto em 1 coronária com obstrução subtotal; 1 paciente com lesão coronária estenótica; 6 pacientes com lesão obstrutiva total de 1 coronária; 1 paciente com 2 coronárias com lesões estenóticas significantes (> 50%); 8 pacientes com 1 coronária estenótica significante e 1 coronária com obstrução total; e 6 pacientes com 3 coronárias estenóticas significantes, 1 paciente com obstrução total das 3 coronárias, 1 paciente com 2 coronárias totalmente obstruídas e 1 coronária estenótica significante, e 4 pacientes com 1 obstrução total de coronária e 2 coronárias estenóticas significantes.

 

A assinergia ventricular foi registrada em 83,9 % (26/31 pts ) e ventriculograma normal em 16,2% (5/31 pts).

 

Confrontados os cateterismos de cada caso, ambos sob a ação contínua do cardiotônico, o panorama angiográfico coronário mostrou-se inalterado em 64,5% (60/93 artérias coronárias), piorado em 21,5% (20/93 artérias coronárias) e melhorado em 14% (13/93 artérias coronárias).

 

Dos segmentos ventriculares, em 90,3% (84/93 segmentos) mostraram-se inalterados, em 7,5% (7/93 segmentos) melhorados e em 2,2% (2/93% segmentos) piorados.

 

O volume residual sistólico apresentou-se inalterado em 77,4% (24/31 pacientes), melhorado em 16,1% (5/31 pts) e piorado em 6,5% (2/31 pts).

 

Na presente série, dentro da evolução natural da aterosclerose coronária e sob a ação ininterrupta do cardiotônico, observamos 7 casos de totalização da obstrução coronária aterosclerótica, sem repercussões clínica, eletrocardiográfica e ventriculográfica, ocorrendo coincidentemente o aparecimento ou a ampliação da circulação colateral.

 

Merece destaque especial o desaparecimento de lesões obstrutivas coronárias e simultaneamente da circulação colateral; constituindo achado de grande interesse prognóstico, de mecanismo ainda obscuro, mas marcante na evolução natural da coronariopatia aterosclerótica (133).

 

Significativamente, a manutenção dos segmentos ventriculográficos inalterados e melhorados, ajusta-se aos efeitos ultimamente destacados por vários autores (73-80) acerca do cardiotônico sobre o miocárdio isquêmico e também assinérgico.

 

Pelo que nos tem sido dado apreciar nesta série, sob administração contínua do cardiotônico, podemos concluir que não importam as transformações no panorama angiográfico coronário; sendo no entanto de real importância a preservação funcional do miocárdio isquêmico: miocárdio isquêmico tonificado é miocárdio protegido e não tem enfartado a longo prazo.

 

A rede de circulação colateral nem sempre é capaz de evitar o enfarte miocárdico, porque seu desenvolvimento é realizado em função do aspecto anatômico do processo obstrutivo e nem sempre é suficiente para atender as exigências da atividade física comum do coronariopata. O papel do cardiotônico parece ser o de completar os efeitos da circulação colateral, dando condições de verdadeiro suporte contra a falência miocárdica regional e ipso facto de prevenir o enfarte miocárdico.

  

 

ÍNDICE