Instituto de Combate ao Enfarte do Miocárdio

 


 

Aspectos Clinicos e Coronario-Miocárdicos Compativeis Com a Teoria Miogênica e Conflitantes Com a Teoria Trombogênica do Enfarte Agudo do Miocárdio

Quintiliano H. de Mesquita, Cardiologista

 

O fracasso dos anticoagulantes e dos trombolíticos na sustação da angina instável (AI) e na prevenção do enfarte miocárdico (EM) mostra-se verdadeiramente conflitante com os conceitos da Teoria Trombogênica (TT) e serve de reforço ao conceito patológico da teoria Miogênica.

No enfarte agudo do miocárdio (EAM), bem caracterizado clinica e electrocardiograficamente, o estudo angiográfico coronário freqüentemente surpreende o cardiologista com registros da ausência de trombose coronária (TC), frente a artérias coronárias normais, fluxo lento em coronárias normais, pontes de veias safena patentes, obstruções coronárias insignificantes (<50%) e até subtotais mas pérvias, quase sempre interpretados comodamente, pelos seguidores da teoria trombogênica, como casos de TC primária dissolvida por fibrinólise espontânea.

Também o achado de antiga placa aterosclerótica obstruindo completamente a artéria coronária satélite do enfarte miocárdico e ausência de TC não têm merecido qualquer explicação quanto ao mecanismo desencadeante do EAM.

Tal conduta parece satisfazer aos ortodoxos defensores da TT mas a consideramos como flagrante omissão, uma vez que se pode justificar e admitir o mecanismo desencadeante como puramente miogênico e responsável pelo EAM primário que pode ser seguido ou não por TC.

Cabe aqui a manifestação de Bulkley e Hutchins (1977) que considerando casos de pontes de safena patentes com necrose de áreas revascularizadas denominaram os mesmos como portadores de enfarte paradoxal, por serem conflitantes com a TT devido a ausência da TC primária.

Segundo os postulados da TM a ausência da TC em todas as condições acima referidas, significa apenas que a estase na coronária satélite do enfarte miocárdico não foi suficiente para produzir a TC secundaria, a exemplo do que foi cabalmente demonstrado através da experimentação de Hellstrom produzindo enfarte miocárdico por ligadura transitória de artéria coronária com endotélio conservado normal e responsável pela TC secundaria.

No período que adotávamos a TT sempre nos impressionaram os registros de casos de EAM desenvolvido durante a pratica de atividade física habitual ou mesmo inusitada, por acharmos que dificilmente o esforço poderia ser considerado como capaz de desenvolver a TC primária, em pacientes portadores de Angina Estável (AE) ou na coronariopatia silenciosa.

Ainda neste particular, registramos caso de paciente jovem que após a subida de 8 andares pela escada foi acometido por enfarte agudo, sem passado anginoso; bem como outros casos em que o EAM foi registrado imediatamente após ou durante a execução do teste ergométrico e também em atleta durante a pratica de basquetebol.

Apresenta-se também como difícil de admitir-se a ocorrência de TC primária em pacientes portadores de coronariopatia, usuários de bloqueador beta adrenérgico que tiveram no seu emprego abruptamente interrompido como a causa responsável pela instalação de EAM e de outras complicações no período de 2-21 dias.

Nessas condições, temos admitido o EAM como resultante do mecanismo puramente miogênico seguinte: na coronariopatia crônica o bloqueador beta adrenérgico, por seu efeito inotrópico negativo, desenvolve hipotonia ventricular generalizada nivelando por baixo os segmentos miocárdicos isquêmicos anulando assim o confronto intersegmentar.

Com a suspensão abrupta do medicamento restabelece-se o agressivo confronto entre os segmentos deficientes contrateis e os normais, dando lugar ao desencadeamento de evidente sofrimento do miocárdio isquêmico manifestado através de taquiarritmias, instabilidade sintomática e miocárdica representada pela AI e/ou instalação do EAM primário como legítima expressão do mecanismo fisiopatológico preconizado pela TM - Insuficiência Miocárdica Regional + Isquemia Ventricular Recíproca - conflitante portanto com os preceitos de TT, mesmo na presença de TC possivelmente secundaria, uma vez que não há razões aparentes para considerar-se em tais condições a TC como Primária.

Esse mecanismo miogênico também se aplica à interpretação de casos observados por nós, quando pacientes coronariopatas tratados e mantidos pelo cardiôtonico, com o objetivo de se manter o nivelamento contrátil dos segmentos miocárdicos isquêmicos e não isquêmicos, interrompem o seu emprego e são surpreendidos pela AI que tem sido facilmente sustada pela readministração da droga ou são então abruptamente acometidos por EAM, logo após a suspensão do cardiotônico, quando os segmentos miocárdicos coronária/dependentes estão severamente comprometidos.

Nos casos tratados com a manutenção ininterrupta do cardiotônico preconizado pela TM, tem sido muito significante a evolução de processos obstrutivos ateroscleróticos de artérias coronárias pérvias para a obstrução total de caráter progressivo mas surpreendentemente observados sem registro de EM.

Merece referência especial o registro de um caso de AI sustada imediatamente pelo cardiotônico, com o quadro angiografico mostrando obstrução total de todas as 3 coronárias, rica rede coronária colateral e ventriculograma com discreto segmento acinético na parede inferior e com volume sistólico final normal; com toda certeza não tivesse recebido o cardiotônico sendo deixado entregue a própria sorte teria fatalmente enfartado naquela ocasião.

Também casos de AI em crescendo sustada pelo emprego do cardiotônico e assim mantidos, em portadores de 2 ou 3 coronárias com lesões estenóticas severas mas pérvias (70-90%) e evidente processo de miocárdiopatia, têm evoluído ao longo do tempo para a obstrução total das coronárias comprometidas sem o registro da instalação do EAM.

Casos de EM prévio com coronárias parcialmente obstruídas mantidos com o emprego do cardiotônico têm progressivamente evoluído para a obstrução total de 2 ou 3 coronárias sempre contempladas por rica rede de circulação coronária colateral fruto da angiogênese natural, espontânea e automática, mas sem instalação de novo EM.

Conflitantes com a TT temos os 67% de nossos 1290 casos denominados como portadores de Quadro Clinico Enfartante (QCE), tratados com o emprego do cardiôtonico e conseqüentemente transformados em QCE-sustados (47%), caracterizados por picos enzimáticos seriados inferiores a 3x o Normal, com excepcional índice de 0,9% de mortalidade e em 20% dos casos interpretados como de enfarte evitado por mostrarem enzimas normais ou com picos ligeiramente aumentados e inferiores a 2x o Normal.

Em 33% dos casos as enzimas mostraram-se com picos superiores a 3x o Normal (em torno de 5x N) e reconhecidos como QCE-Enfartados com mortalidade de 32% para a mortalidade global de 12,2%.

Tudo isso tem sido conseguido com a administração dos novos conceitos terapêuticos preconizados pela TM.

Dos nossos excepcionais e insuperáveis resultados obtidos com o emprego do cardiotônico na sustação clinica da AI em crescendo em 100% dos casos e sem mortalidade; em apenas 1 caso registramos a evolução para o EAM, 8 dias depois de sustada a AI e por falha na manutenção do cardiotônico.

São índices incomparáveis e seguros diante dos referidos nos casos tratados segundo os preceitos da ortodoxia cardiológica, tais como: EM em 7,8% e Mortalidade de 6,2% nos casos clinicamente tratados e EM em 9,6% e Mortalidade de 6,3% nos casos cirurgicamente tratados.

Merece especial destaque o caso de AI sustada que mostrou artérias coronárias descendente anterior esquerda, direita e circunflexa normais com fluxo lento; ventriculograma com volume residual aumentado (+/++) e hipocinesia da parede anterior. Repetida a cinecoronariografia 2 anos após, revelou: obstrução total da coronária descendente anterior esquerda, distalmente, volume residual sistólico aumentado (++) e também a região assinergica anterior; sendo mantido o paciente com o emprego ininterrupto do cardiotônico em condições de estabilidade sintomática e miocárdica, sem enfarte miocárdico.

Logo após a elaboração da Teoria Miogênica ( TM ) tomamos conhecimento através de trabalho de William C. Roberts (1972) da existência de grande numero de anatomopatologistas dissidentes que admitiam a Trombose Coronária ( TC ) como secundária ao enfarte do miocárdio (EAM), o que nos tem servido como importante respaldo durante todos esses anos.

Desde então estruturamos a base anatomopatológica dos conceitos da TM, reforçada por todos os subsídios que fomos coligindo na literatura e que apresentamos a seguir:

a.                Obstrução coronária completa, de natureza aterosclerótica representando cerca de 75% dos casos e TC recente em apenas 25% dos casos autopsiados por Spain e Bradess (1960).

b.               Crescente incidência de TC com a crescente duração da sobrevida no pós-enfarte miocárdico, menos de 1 hora com 16% de TC, entre 1-14 horas com 37% e com mais de 24 horas com 53% de TC segundo Spain e Bradess (1960).

c.                TC incorporando fibrinogênio marcado pelo I-125 administrado 10-15 horas após o inicio das manifestações clinicas de enfarte, fato esse que sugere a TC como conseqüência da necrose miocárdica primaria.

A exclusão de I-125 do trombo desenvolvido em um caso, quando administrado 47 horas após o inicio do processo, ocorreu provavelmente porque nesse período a TC já se formara e então a administração tardia da substancia radioativa serviu para demonstrar o significativo valor da administração precoce e ainda durante a formação do trombo (Erhardt e col., 1973).

A administração de I-131 confirmou os achados anteriores de Erhardt e col. (1976)

d.               A TC pós -enfarte foi demonstrada também experimentalmente por Hellstrom (1970) quando produzia o enfarte miocárdico por ligadura de artéria coronária sem lesão endotelial e a TC ocorria depois de liberada a coronária e com o enfarte miocárdico instalado.

e.                Embora os anatomopatologistas dissidentes tenham identificado a grosso modo a necrose miocárdica como aparentemente primaria e a TC como secundaria, permanece o assunto controvertido e com o impasse gerado pela impossibilidade ainda existente, segundo Chandler e col. (1974) em saber-se qual das duas é realmente a primaria quando concomitantemente observadas.

Esboçado novo mecanismo fisiopatológico para o EAM com a elaboração da TM, necessariamente descortinava-se como conseqüência um novo conceito terapêutico de que o cardiotônico, na prática, iría nos servir de comprovação da TM.

Desde então o novo mecanismo fisiopatológico atribuído a Angina Instável (AI) e ao EAM passou a ser representado pela Insuficiência Miocárdica Regional (IMR) desencadeando Isquemia Ventricular Recíproca (IVR), apresentando-se como processo espontaneamente reversível na primeira condição e irreversível no EAM; tendo surgido então como exigência natural o cardiotônico que deve ser administrado o mais precocemente possível, por representar a terapêutica especifica em ambas as condições.

Na primeira é administrado a fim de corrigir a falência miocárdica regional em curso sustando-a e pondo termo às freqüentes manifestações episódicas e recidivantes.

Na segunda condição para evitar que a irreversibilidade espontânea da IMR e IVR com suas conseqüências estruturais sejam interrompidas e possam assim sustar o processo enfartante ou pelo menos limitar a zona necrótica.

Nessas condições o cardiotônico é tido como protetor miocárdico (Mesquita, 1973; Pizzarello e col., 1975; Morrison e col., 1976 e 1980) porque salvará as fibras miocárdicas falentes e isquêmicas mas viáveis, da necrose certa que ocorre nos processos deixados à própria sorte

Ultrapassada esta fase aguda tanto na AI como no QCE, o cardiotônico passará a ser empregado como tratamento de manutenção representando a profilaxia do EM, quando se procura preservar o miocárdio isquêmico do ponto de vista contrátil, evitando-se a insuficiência miocárdica regional e complementando-se assim os benéficos efeitos corretivos coronária-miocárdicos da circulação colateral.

Enfatizando ainda mais sobre o emprego do cardiotônico em tais condições clinicas conflitantes com a TT, devemos destacar a raridade do EM em portadores de insuficiência cardíaca (IC) crônica, sob uso continuo do cardiotônico.

Achados importantes foram registrados sobre a incidência de trombos intracoronários constatados na fase aguda de AI (52-85%) dentro de poucas horas após os sintomas ativos e em até 2 semanas, enquanto a sua incidência na fase crônica tem sido sempre baixa (0-12%), parecendo-nos assim que na AI os episódios de IMR e de prolongada IVR propiciam a hiperagregação plaquetária e formação de trombos intracoronários, que desaparecem ou são reduzidos dentro de 30-90 dias após o ultimo ataque de AI (Zack e col., 1984; Higashino e col., 1987; Gotoh e col., 1988).

Em conseqüência do novo mecanismo fisiopatológico de EAM, essencialmente miogênico, a introdução do cardiotônico representa a exigência natural e serve sempre à comprovação da TM, desde que o estagio critico da AI e do EM é a IMR e IVR com seus efeitos hemodinâmicos, metabólicos e isquêmicos, precursores da necrose miocárdica primaria.

No EAM o cardiotônico deve ser administrado o mais precocemente possível, a fim de corrigir a IMR instalada e ainda sem processo necrótico definido.

Ambrose e col. (1988) passaram a considerar o EM sem onda Q como processo evolutivo entre a AI e o EM com onda Q. Tal postulação muito nos animou porque a referida gradação parece ajustar-se mais à TM do que à TT. Registraram processos obstrutivos coronários totais em 26% dos casos sem onda Q e em 90% dos casos de EM com onda Q.

Neste particular, angiografias coronárias realizadas precocemente no EAM mostram índices de obstrução total em 75% dos casos com onda Q e 46% nos EM sem onda Q (Ogawa e col., 1981; DeWood e col., 1986; Ambrose e col., 1988; André Fouet e col., 1989).

DeWood e col no EM sem onda Q registraram oclusão coronária total em 32% dos casos e em um estudo mais detalhado observaram com destacada importância a incidência de obstrução total, significante e progressivamente aumentada com relação ao intervalo de tempo para a execução do exame angiográfico: 26% dentro de 24 horas, 37% de 24-72 horas e de 42% de 72 horas-7 dias. No entanto observaram oclusão subtotal (>90%) no EM sem onda Q, com particular significação a incidência diminuída gradualmente: 34% dentro de 24 horas, 26% dentro de 24-72 horas e 18% de 72 horas-7 dias.

No tocante aos efeitos dos tromboliticos administrados na AI os resultados tem indicado melhora nos eventos arteriais coronários e ineficácia quanto aos eventos clinicos (Rentrop e col., 1981; Williams e col., 1990; Lenbach e col., 1992; Freeman e col., 1992; Bar e col., 1992; TIMI IIIA Investigators, 1993; Cheng e col., 1997). Conseqüentemente, os autores deixaram de recomendar o seu emprego na AI.

Como se vê, parece-nos que o fracasso dos anticoagulantes na AI (Mesquita, 1954) e agora o insucesso dos tromboliticos também na AI, são significantemente conflitantes com a TT e reforçam a TM, principalmente diante dos resultados alcançados pioneiramente com o cardiotônico introduzido em 1972 que tem servido como teste à comprovação da TM.

Da nossa experiência clinica iniciada em 1972, os resultados obtidos com o cardiotônico como o novo tratamento da AI foram gratificantes e tornaram-se incomparáveis e insuperáveis nos últimos 26 anos.

Também através de ensaios terapêuticos levados a efeito com o emprego do cardiotônico no EAM vieram contraditar antigos conceitos sobre o cardiotônico apresentado como nocivo ao EAM sem IC (Travell e col., 1938; Kumar e col., 1970; Maroko e col., 1971), tendo sido cabalmente demonstrado seus especificos efeitos pelos trabalhos experimentais de Puri, 1974; Kerber e col., 1974; Banka e col., 1975 e Vatner e Baig, 1978 que vieram confirmar e dar maior destaque a antigos trabalhos clinicos bem elaborados e conclusivos (Herrick, 1912; Hamman e col., 1926, Schemm, 1950; Askey, 1951; Boyer, 1955; Malmcrona e col., 1966; Constant, 1970; Reicansky e col., 1976; Loeb e col., 1976; O'Rourke, e col., 1976) e que anulam definitivamente tais preconceitos, destacados sobejamente pelos nossos trabalhos (Mesquita e col., 1973, 1979, 1981, 1991), conferindo assim ao cardiotônico um efeito protetor miocárdico confirmado por Pizzarello e col, 1975 e Morrison e col., 1976 e 1980).

As reações enzimáticas seriadas com picos nitidamente reduzidos justificam tal efeito protetor miocárdico ao cardiotônico que nos ajudaram a interpretar o aparente quadro clinico de EAM como ainda enfartante, no momento de sua admissão e administração da nova rotina terapêutica.

Também o emprego do cardiotônico nos casos de estabilidade sintomática e miocárdica com e sem EM prévio, a longo prazo, tem sido marcado por excepcionais e insuperáveis índices de EM e de mortalidade.

Enfatizando ainda mais tais considerações clinicas que se antepõem ao processo trombogenico primario, devemos destacar a raridade do EM em portadores de insuficiência Cardíaca crônica, sob uso continuo do cardiotônico.

Por analogia, nos portadores de cardiopatia aterosclerótica fatores desencadeantes e circunstanciais da asma cardiaca e edema agudo do pulmão de um lado e EAM do outro, são interpretados por nós como dependentes do idêntico mecanismo fisiopatologico miogênico de deterioração progressiva até o desencadeamento da falência global do ventrículo esquerdo nas 2 primeiras condições clinicas, enquanto nos últimos a falência miocárdica é regional e agravada pelo confronto com os demais segmentos íntegros coronária/dependentes.

Ganhou importância o trabalho de Tennant e Wiggers (1935) sobre o efeito inotrópico negativo da isquemia miocárdica, quando foi também demonstrado através da Ecocardiografia a insuficiência miocárdica regional durante crises anginosas (Feingenbaum e col., 1976; Massie e col., 1978 e Braunwald e Kloner, 1982).

Nestas condições, o Ecocardiograma mostra que o miocárdio isquêmico perde sua contratilidade e o não isquêmico mostra vicariante aumento de contratilidade, caracterizando-se assim os efeitos do confronto intersegmentar com sérias implicações no estagio da estabilidade sintomática e miocárdica, registrados nos episódios de AE.

 

Passamos a apresentar casos bem representativos publicados no Livro Teoria Miogênica do Enfarte Miocárdico

Casos de QCE-Evitado

Como casos de QCE com enfarte evitado, temos curiosos exemplos só compatíveis com a TM dentro dos conceitos fisiopatológicos e terapêuticos, merecendo especial destaque os aspectos coronariográficos, ventriculográficos e transitórios padrões electrocardiográficos:

Caso 23SM: com registro de picos enzimáticos normais, padrões eletrocardiograficos de enfarte agudo da parede anterior com reversibilidade completa do complexo QRS (deflexão QS) dentro de 3 meses. Artérias coronárias direita, descendente anterior esquerda e circunflexa exibindo tortuosidades em todo o trajeto mas sem alterações ateroscleróticas e ventriculograma com hipertrofia.

- Comentários: reações enzimáticas normais a despeito da grande duração do QCE (22 horas), evidenciando o importante papel da resistência miocárdica individual frente a isquemia. Caso interpretado como enfarte evitado. Mais um exemplo da importância diagnostica do ECG, sem condições de valorização prognostica. TGO=15u (N=19u), DHL=79u (N=92u) e CPK=48u (N=84u).

Caso 363: com registro de picos enzimáticos normais (TGO e CPK) e <2xN (DHL); padrões electrocardiográficos de enfarte anterior extenso com reversibilidade rápida da faixa lateral (V4 - V6) e regressão lenta (4 meses) da faixa septal (V1 e V2). Registro dos 4 estágios electrocardiograficos - segmento RS-T e onda T - sob a ação do cardiotônico na fase aguda do enfarte. Artéria coronária direita (CD) com discretas lesões difusas fornecendo circulação colateral para a circunflexa (CFX) com obstrução total na origem; artéria descendente anterior (DAE) esquerda com obstrução total ao nível do 1/3 médio; ventriculograma mostrando hipertrofia e dilatação difusa das faces anterior e anterolateral, disfunção ventricular esquerda  com aumento do volume residual sistólico e da pressão final.

- Comentários: crise dolorosa de 5 horas. Portador de 2 coronárias com obstrução total - DAE e CFX - possivelmente responsáveis pela acentuada condição de assinergia ventricular difusa, mas representando equilíbrio ou harmonia patológica. Identificado como caso de enfarte evitado através das enzimáticas seriadas normais, exceto a ligeira elevação da DHL. Do ponto de vista electrocardiográfico o processo mostra a evolução comum a paciente submetido ao cardiotônico e através dos 4 estágios do segmento RS-T e onda T. No presente caso a obstrução total das 2 coronárias é interpretada como condição pré-existente, uma vez que o quadro clínico do processo obstrutivo trombótico recente não seria beneficiado pelo cardiotônico e evoluiria com picos enzimáticos seriados bem evidentes e naturalmente os padrões electrocardiográficos se mostrariam bem caracterizados e irreversíveis. Cabe-nos destacar aqui o valor diagnóstico do ECG, precoce, de caráter topográfico, mas desprovido de qualquer significado prognóstico pela reversibilidade dos padrões, de acordo com a caracterização fornecida pelas reações enzimáticas de ausência de enfarte agudo. TGO=21u (N=40u), DHL=282u (N=135u), CPK=20us (N=20us).  

Caso 79: com registro de enzimas seriadas normais - enfarte evitado - padrões electrocardiográficos de enfarte inferoseptal com reversibilidade em 7 meses; coronária direita com lesão estenótica de 50% em seu 1/3 médio e calibre distal satisfatório, artéria descendente anterior com ponte miocárdica, circunflexa com discretas irregularidades parietais; ventrículo esquerdo com hipertrofia concêntrica e contratilidade conservada em todas as faces.

- Comentários: exemplo de ponte miocárdica na descendente anterior esquerda e coronária direita com moderada lesão estenótica, correspondente à parede ventricular sede do processo enfartante como de enfarte evitado, ficando a ponte miocárdica alheia a este processo.

Caso 12SM: com registro de enzimas seriadas < 2xN - enfarte evitado - padrões electrocardiográficos de enfarte inferior com regressão em 5 meses; coronária direita com obstrução total proximal e circulação coronária colateral procedente da coronária esquerda, coronária descendente anterior esquerda com lesões discretas, artéria circunflexa com obstrução de 50% na origem da 1ª marginal, ventriculograma com acinesia inferior.

- Comentários: exemplo de obstrução total da CD interpretada como pré-existente em relação ao QCE, sustado, porque as reações enzimáticas não têm expressão de processo necrótico definido. O quadro acentuado das lesões coronárias não teve qualquer repercussão sobre os quadros clinico, electrocardiográfico e ventriculográfico do caso. A regressão electrocardiográfica é rápida e a onda T coronária é transitória e firma-se como a regra também no enfarte inferior. TGO=38u (N=19ui), DHL=106ui (N=92ui), CPK=104ui (N=84ui).

 Caso 327: com registro de enzimas seriadas ligeiramente superiores a 2xN - enfarte evitado - padrões electrocardiográficos iniciais de enfarte inferior com rápida regressão para alterações discretas de RS-T e T (subendocárdico ou sem onda Q); artéria coronária direita com obstrução de 90% no 1/3 médio fornecendo circulação coronária colateral para as artérias descendente anterior esquerda com obstrução total na origem e circunflexa com obstrução de 70% no tronco e obstrução total no ramo AV; tortuosidades em todas as artérias referidas e ventriculograma normal.

- Comentários: deve ser destacada a harmonia ventricular patológica frente a coronariopatia grave, sem assinergia e com regressão rápida do processo isquêmico iniciado na parede inferior e esboçado no 1º ECG. Os efeitos da terapêutica de ataque devem ter sido decisivos e a manutenção do cardiotônico parece preservar funcionalmente o miocárdio isquêmico e estamos seguros quanto à sua importância na profilaxia do enfarte, segundo preconiza a Teoria Miogênica. TGO=500u (N=400u), CPK=47us (N=20us).

Caso 141: com registro de enzimas seriadas normais, padrões electrocardiográficos de enfarte anteroseptal com QS permanente em V1 e V2; artéria coronária direita com lesões discretas e fornecendo circulação coronária colateral para as demais artérias coronárias como o tronco da coronária esquerda com obstrução de 60%, descendente anterior esquerda com obstrução de 90% proximal e circunflexa com obstrução de 60% na origem e 90% no 1/3 médio, mas com função ventricular conservada.

- Comentários: paciente hipertenso com lesões coronárias significativas, embora acometido por prolongada precordialgia (12 horas), caracterizou-se por ausência de repercussão enzimática e ventriculograma normal, sendo interpretado como enfarte evitado. A ausência da deflexão R em V1 e V2, permaneceu como alterações residuais e pode ser decorrente do processo isquêmico crônico sem enfarte. TGO=26u (N=19u), DHL=87u (N=92u), CPK=80u (N=84u).

 

Caso 104: com registro de enzimas seriadas ligeiramente superiores a 2xN, considerado como enfarte evitado, padrões electrocardiograficos de enfarte anteroseptal com alterações de onda T coronária de curta duração, o que constitui uma característica dos casos assim tratados, artérias coronárias direita, descendente anterior esquerda e circunflexa angiograficamente normais e com fluxo lento, ventriculograma com acinesia anteroapical e volume residual sistólico aumentado (++/+++).

- Comentários: no 1º cateterismo suspeitamos das condições anatômicas do ramo marginal da DAE e 2 anos após (2º cateterismo) o achado de lesão estenótica subtotal da DAE reforçou a suspeita inicial. O fluxo lento coronário, como em outros casos, deve ser responsabilizado pelo processo enfartante e a assinergia anteroapical corresponde à doença segmentar miocárdica crônica e sugere também a concomitância do processo estenótico da DAE. Neste caso, o mecanismo miogênico parece justificar o desenvolvimento do QCE e a ação protetora do cardiotônico. TGO=75u (N=40u), DHL=710u (N=500u), CPK=48us (N=20us)

Caso 55: com registro de enzimas seriadas ligeiramente superiores a 2xN e considerado como enfarte evitado, padrões electrocardiográficos de enfarte inferoseptal com regressão para a normalidade em 3 meses, artéria coronária direita com obstrução total na origem com circulação coronária colateral procedente da própria coronária direita e da descendente anterior esquerda; artérias descendente  anterior esquerda e circunflexa normais, ventriculograma normal.

- Comentários: portador de lesão obstrutiva total da artéria CD com enfarte evitado e sem repercussão ventriculográfica, fato comum para tais lesões de CD isolada, devendo ser destacado o desaparecimento da obstrução total (2º cateterismo), cujo mecanismo apresentava-se como obscuro, particularmente também desapareceu a rede de circulação colateral coronária registrada no 1º cateterismo (2 anos antes). O ventriculograma normal nos 2 exames deve ser decorrente do emprego constante do cardiotônico que habitualmente serve para corrigir importantes processos assinérgicos. TGO=84u (N=40u), DHL=895u (N=500u), CPK=44us (N=20us).

Casos de QCE-Sustado

Casos de QCE-Sustado que merecem registro por causa de alterações coronárias evidentes e que no enfartado típico têm levado os ortodoxos a pensar na TC primaria; no entanto as características enzimáticas de processo sustado e electrocardiograficamente regressivo mostram-se compatíveis com a TM:

Caso 466: com registro de enzimas seriadas do tipo QCE-sustado (<3xN), padrões electrocardiográficos de enfarte anterior extenso com reversibilidade completa do complexo QRS e onda T em 9 dias e registro de hemibloqueio anterior esquerdo; artéria coronária direita com obstrução total proximal, artéria descendente anterior esquerda normal e circunflexa com obstrução de 90% na origem da 1ª marginal e segmento mediano do ramo AV com lesão estenótica de 40%, fornecendo circulação coronária colateral para a coronária direita; ventriculograma com hipocontratilidade nas faces inferior e anterolateral.

- Comentários: exemplo de paciente portador de obstrução total de CD e padrão electrocardiográfico de enfarte anterior, com artéria descendente anterior normal e circunflexa estenótica possivelmente responsável pelo QCE. Mais um exemplo de coronária pérvia para a região anterior do VE, sede do processo enfartante enquanto a região miocárdica dependente da CD totalmente obstruída apresenta-se apenas assinérgica. A reversibilidade completa do complexo QRS nas derivações precordiais múltiplas, em tão curto período, constitui fato novo em evolução electrocardiografica de EAM, indicando por isso a denominação de QCE, cuja evolução vai caracterizar o processo de enfarte sustado; também o ventriculograma afasta o diagnostico de enfarte anterior e reflete o processo de harmonia patológica, decorrente da coronariopatia com 2 coronarias lesadas. No dia da alta hospitalar, o registro de reflexão QS em D3 e aVF deve ser decorrente da recuperação da isquemia da parede anterior e a provável reativação do processo isquêmico da parede inferior, coincidente com a obstrução completa da CD. TGO=83u (N=40u), DHL=187ui (N=135ui), CPK=69us (N=20us).

Caso 66SM: com registro de enzimas seriadas do tipo QCE-S, padrões electrocardiográficos de enfarte anterior com hemibloqueio anterior esquerdo transitório; artéria coronária direita normal, descendente anterior esquerda com obstrução total na origem e circulação coronária colateral procedente da coronária direita, artéria circunflexa normal, ventriculograma com volume residual sistólico aumentado (+++), assinergia anteroapical e pressão residual diastólica aumentada.

- Comentários: exemplo de obstrução total de DAE com grande repercussão sobre a parede anteroapical do VE. Diante dos picos enzimáticos conclui-se pela pré-existência da obstrução total da DAE e o padrão eletrocardiográfico deve ser decorrente da isquemia crônica e conseqüente doença miocárdica segmentar sem enfarte. TGO=103u (N=40u), CPK=29us (N=20us).

Casos de QCE-Enfartados

Caso 307: com registro de enzimas seriadas do tipo QCE-E (>3xN), padrões electrocardiográficos de enfarte anterior extenso com reversibilidade absoluta dentro de 3 meses e com o registro dos 4 estágios das alterações de RS-T-T; artéria coronária direita normal, artéria descendente anterior esquerda com lesão estenótica de 95%, circunflexa normal, ventriculograma com hipocinesia anteroapical.

- Comentários: deve ser destacada a ausência de obstrução total de coronária em processo enfartante com características electrocardiograficas iniciais de processo anterior extenso, transmural, mostrando rápida regressão com patente nova geração de potencial (deflexão R) e por isso destituído de qualquer significado prognostico. O caso presente ajusta-se à concepção miogênica do enfarte, sem trombose primaria e resolução de todos os aspectos marcantes iniciais. Exemplo típico dos 4 estágios electrocardiograficos quanto ao comportamento do segmento RS-T e onda T sob cardiotônico. Em seguida nota-se a normalização do segmento RS-T e da onda T enquanto a reversibilidade do complexo QRS foi completa em 5 dias, o que para nós afasta a possibilidade de enfarte apesar dos níveis enzimáticos registrados, em torno de 4-5 x N.  TGO=201u (N=40u), CPK=84us (N=20us).

Caso 245: com registro de enzimas seriadas do tipo QCE-E, padrões eletrocardiográficos de enfarte inferolateral com regressão completa do QRS em 31 dias; artéria coronária direita com lesão estenótica de 50% proximal, artéria descendente anterior esquerda com lesão estenótica de 80% ao nível do 1° ramo septal, artéria coronária circunflexa com obstrução total da artéria marginal, ventriculograma com hipocinesia anterolateral, volume residual sistólico aumentado (+++).

- Comentários: exemplo de paciente considerado enfartado com obstrução total de CFX com rápida reversibilidade electrocardiográfica. Nestes casos fica a duvida quanto ao processo obstrutivo se seria ou não pré-existente, porque a assinergia não é peculiaridade de obstrução total e possível enfarte e além disso os níveis enzimáticos são relativamente reduzidos. TGO=169u (N=40u), DHL=394u (N=240u), CPK=78us (N=20us).

Caso 234: com registro de enzimas seriadas do tipo QCE-E, padrões electrocardiográficos de enfarte anterior extenso com reversibilidade da faixa lateral em 2 meses e transitória onda T coronária; artéria coronária direita de pequeno porte com discretas lesões parietais fornecendo circulação coronária colateral para a artéria descendente anterior esquerda com lesão estenótica de 90% proximal além de ponte coronária, artéria coronária circunflexa com discretas lesões difusas, ventriculograma com acinesia anteroapical e prolapso de valva mitral.

- Comentários: exemplo de ponte miocárdica no 1/3 média da DAE, enquanto o 1/3 proximal apresenta lesão estenotica de 90%. O enfarte registrado electrocardiograficamente corresponde a esta artéria. Registra-se também prolapso de valva mitral. Temos a impressão de que a lesão intrínseca da DAE seria responsável pelo processo enfartante. TGO=174u (N=40u), DHL=177u (N=135u), CPK=80us (N=20us).

Caso 140: com registro de enzimas seriadas do tipo QCE-E, padrões electrocardiográficos de enfarte anteroseptal com regressão quase completa em 4 meses, 4 estágios de RS-T-T típicos; artéria coronária direita com lesões discretas difusas e 90% no 1/3 distal, artéria descendente anterior esquerda com obstrução subtotal ao nível do 1º ramo septal, artéria coronária circunflexa com obstrução total do 1º ramo marginal e 90% do 2º ramo marginal, ventriculograma com hipocinesia difusa e volume residual sistólico aumentado (+++).

Comentários: deve ser destacada a harmonia patológica que ocorre na grave coronariopatia de 3 coronárias lesadas simultaneamente. Os níveis enzimáticos levam-nos a pensar que o processo enfartante-enfartado, não foi determinado por TC primaria; sendo interpretado como processo de desgaste miocárdico crônico e mecanismo miogênico no segmento mais incapacitado, logo protegido pelo cardiotônico e responsável pelo salvamento de fibras miocárdicas viáveis. TGO=141u (N=40u), CPK=76us (N=20us).

Caso 69: com registro de enzimas seriadas do tipo QCE-E, padrões eletrocardiográficos de enfarte inferior sem evolução de onda T marcante; artéria coronária direita com lesão estenótica de 95% no 1/3 médio, artéria descendente anterior esquerda com lesão estenótica de 90% ao nível do 1º ramo perfurante, artéria circunflexa com lesão estenótica de 90% no tronco fornecendo circulação coronária colateral para a coronária direita, ventriculograma com acinesia diafragmática e hipocinesia anterior, com volume residual sistólico aumentado (+/++).

Comentários: exemplo de QCE-E com nítidos níveis enzimáticos e brusca regressão ao normal. Este comportamento torna evidente a ausência de efeito direto do cardiotônico sobre a liberação enzimática, dentro de nossa rotina com repetidas determinações e no decurso do emprego do cardiotônico. As 3 grandes coronárias lesadas mostram mais equilíbrio em suas repercussões ventriculográficas com aparente predominância de processo que compromete a parede inferior. Mais um exemplo de enfarte com processo de lesões estenóticas que se ajusta ao conceito da teoria miogênica do enfarte. TGO=174 (N=40u), DHL=1870u (N=500u), CPK=146us (N=20us).    

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